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Air India: Culpar o piloto morto pelo acidente é mais velho que o Zeppelin

No dia 22 de maio de 2010, um Boeing 737-800 (next generation), de prefixo VT-AXV, da Air India Express (subsidiária da Air India), no vôo IX812 procedente de Dubai, nos Emirados Árabes, partiu com destino a Mangalore na India. As 06:00hs, sob chuva leve e baixa visibilidade, o avião com 6 tripulantes e 160 passageiros a bordo, saiu da pista ao tentar pousar no aeroporto de Mangalore-Bajpe, no sul da Índia, colidindo com a floresta de um terreno montanhoso ao final da pista 24. O B737-800 pegou fogo na colisão, 8 pessoas sobreviveram.

Ao final do sábado as autoridades indianas correram para apresentar o registro de que o piloto estava 600 metros acima da altitude correta em determinado ponto da rampa de pouso, ou seja, tocou a pista muito além do local correto (de touch-down) e, portanto, o erro do piloto seria a explicação para mais este acidente.  Essa explicação simples resolve o problema da mídia, mas piora muito a qualidade da segurança de vôo.

Fonte: G1
Fonte: G1

Um acidente não tem uma única causa. Mas um grupo de fatores contribuintes que se não forem trabalhados estarão construindo um novo acidente no futuro.

Neste acidente da India, faltou dizer que:

1) Nos últimos anos a Air India apresentou sucessivos prejuízos em seu balanço patrimonial. Que em 2008 a empresa estatal fundiu-se com a Indian Air (outra estatal), para juntas enfrentarem um novo cenário na aviação indiana que envolvia custos de combustíveis e salários em elevação, além da concorrência com novos entrantes (outras cias. aéreas no país).

2) Que os problemas financeiros da Air India eram significativos, pois em junho de 2009 teve problema para renovar seus seguros (3o maior custo de uma cia. aérea). A Air India usufruiu de uma lei federal da India que permitia adiar a renovação por 3 meses sem perder a cobertura do seguro. E neste tempo adquiriu um empréstimo de emergência de seu proprietário (governo) para quitar o seguro.  

3) Que na India a investigação de acidentes não é efetuada por um órgão independente. O Departamento de Direção Geral de Aviação Civil tem vínculo com o mesmo setor que é proprietário da Air India / Indian Air. Em suma, como se pode esperar rigor, multas, punições para as empresas do governo?

4) O aeroporto de Mangalore tem duas pistas: a 09/27, de asfalto, com 1.615 metros e a 06/24, de concreto, com 2.450 metros. Esta última foi entregue em 2006. Recentemente o governo investiu na ampliação do terminal que foi entregue há apenas 10 dias. E há projetos de ampliação para uma pista de taxi-way.  

Com todas estas informações acima, podemos criar as seguintes questões a serem respondidas em uma investigação séria:

a) Será que a pista de concreto, entregue em 2006, tinha grooving para escoar a água da chuva? Foi feita alguma manutenção nesta pista? Pois o trânsito de aeronaves na pista vai ” emborrachando” a mesma tornando-a mais escorregadia.

b) As dificuldades financeiras da Air India afetaram o pagamento de salários na empresa? Como estavam o treinamento dos pilotos? Como estavam o descanso dos mesmos? Havia pressão nos pilotos para evitarem desvios de rotas ou de aeroportos, mesmo sob condições meteorológicas adversas, pois estes elevam os custos das empresas?

O que está meio óbvio até agora é o seguinte: houve de fato um erro do piloto, aliado a uma condição meteorológica adversa. Outra questão é que o pouso neste aeroporto localizado no topo de uma montanha e cercado de montanhas é bem difícil, inclusive a pista não é num terreno totalmente plano. E, por último, o avião Boeing 737-800 era novíssimo, vôo inaugural foi em 20/12/2007 e, portanto, problemas de manutenção não devem ter contribuído neste caso.

Mas o mais importante nesta investigação do vôo IX812 é descobrir: Quais fatores levaram ao erro do piloto? O que ainda está obscuro neste acidente? Pois simplesmente culpar o piloto pelo acidente é um atraso que ratificará uma miopia na gestão da segurança de vôo indiana.

A Reliance General Insurance é a seguradora da AirIndia. Em setembro de 2009 renovou a apólice de uma congênere, garantindo US$ 8,59 bilhões em coberturas para 134 aeronaves pelo preço de US$ 24,3 milhões. O resseguro é liderado pela Mitsui Sumitomo através da Global Aerospace.

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Quem compra Cessna não é demitido ! Comentários do acidente com o Caravan da FAB.

A Força Aérea Brasileira conta com uma frota de aproximadamente 800 aeronaves. Ela utiliza, com pequenas diferenças, o mesmo código da Força Aérea dos Estados Unidos (USAF) para classificar suas aeronaves. Uma mesma aeronave pode ser chamada pela designação dada pelo fabricante ou pela Força Aérea Brasileira. Na nomenclatura da FAB, C significa avião de transporte. A FAB possui em operação 7 aeronaves Caravan (208A) e 10 aeronaves Grand Caravan (208B), estas aeronaves receberam a designação C-98 e C-98A. Ou seja, o C-98 da FAB é o código do avião C-208. Por isso as matérias veiculadas na imprensa confundiram muita gente… afinal é C-98 ou C-208? Ambos estão certos, um refere-se ao modelo do avião e o outro refere-se ao código militar para o avião.
A história desse avião é a seguinte: na fábrica da Cessna, localizada no Kansas (EUA), o primeiro modelo de produção do Caravan foi o 208A ou simplesmente Caravan 1, certificado pela FAA em 1984 e inicialmente produzido em 1985. Em 1997, a Cessna introduziu um motor mais potente (Pratt & Whitney – PT6A-114A) inaugurando a versão 208A ou Caravan 675. Depois veio a variante mais alongada para até doze assentos – C-208B – que iniciou fabricação em 1986, chamando-se Grand Caravan. Todas essas versões admitem acoplar flutuadores (esquis) tornando-os anfíbios para pouso e decolagem na água. Esses diferentes modelos podem apresentar configuração de assentos 1+9 até 1+14, sendo o mais comum na aviação comercial 2+8. O avião em cruzeiro atinge 341 Km/h. A partir de 2007 a Cessna acrescentou no Caravan, aviônicos que dão maior segurança tais como: GPS, TCAS e Anti-icing.

Este avião é perfeito para operações na Amazônia. Porque? Por que ele pode pousar em qualquer tipo de pista, independentemente do terreno. Além disso seu projeto permite o uso de flutuadores para pouso nos rios da região.  É uma aeronave que responde bem em casos de emergência para pousos na água, mesmo sem o flutuador acoplado. Enfim, há uma máxima na aviação que se aplica neste caso: “Quem compra Cessna não é demitido!”.

Na manhã da última quinta-feira (29/10), o avião da FAB fez um pouso forçado no igarapé Jacurapá, sem os flutuadores, devido a perda de potência do seu único motor. Nove pessoas sobreviveram e duas faleceram. A aeronave C-98 Caravan foi levada pela correnteza e repousou a aproximadamente 6 metros de profundidade, a 6 metros da margem do rio e distante em torno de 370 metros do local onde foram resgatados os nove sobreviventes, na manhã do dia seguinte (30/10).

Alguns acidentes deste mesmo tipo já aconteceram na Amazônia, com o mesmo avião, felizmente sempre com sobreviventes. E geralmente com o piloto tentando pousar no rio, o que é uma boa solução neste caso. Alguns destes acidentes eu mesmo analisei pelo seguro, fato que me deu experiência e permitiu prever acertadamente os acontecimentos na minha entrevista dada ao Jornal “Em Cima da Hora” da Globonews, na manhã do dia 30, quando ninguém ainda havia sequer localizado o avião.

Resta saber o que causou a perda de potência no motor. Perda de combustível, falha no abastecimento, falha de equipamento ou de sua manutenção? O fato é que acidentes com a FAB, além de raros, não ocorrem por negligência. Portanto, o erro de um procedimento ou operação não prevista servirá de ensino até para a Cessna evitar futuros acidentes. Este acidente, por si só, não pode macular a imagem da nossa Força Aérea.